ANÁLISE DO GENE CCR5 EM PACIENTES INFECTADOS PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA (HIV)

Priscila Farias Tempaku, Dercy José de Sá Filho

Resumo


A AIDS é definida como uma doença causada pela infecção com o vírus da imunodeficiência humana (HIV), sendo caracterizada pela imunossupressão profunda associada a infecções oportunistas, neoplasias malignas e degeneração do sistema nervoso central (ABBAS; LICHTMAN, 2005). O HIV infecta células que expressam o receptor celular de superfície CD4 (DOUEK et al, 2002). Para a infecção, ainda é fundamental a interação das glicoproteínas do HIV com os co-receptores CCR5 ou CXCR4 (GROTTO; PARDINI, 2006). O receptor CC-quimiocina 5 (CCR5) é um receptor de quimiocinas e possui uma estrutura com sete domínios transmembranares α-helicoidais, acoplados a proteína G de ligação ao trifosfato de guanosina (GTP). Liga-se naturalmente a quimiocinas, macrófagos inflamatórios proteína 1a (MIP-1a), macrófagos inflamatórios proteína 1b (MIP-1b) e regulamenta a ativação de células T normais expressas e secretadas (RANTES) (BARMANIA; PEPPER, 2013).Além disso, também é ligante para as glicoproteínas do envelope do HIV (SAMSON et al., 1996). É designado pelo símbolo gênico CMKBR5 e seu gene estrutural foi mapeado no cromossomo humano na posição 21 do braço curto do cromossomo 3 (3p21) (DEAN et al., 1996).

Liu et al. (1996) primeiramente observaram que alguns indivíduos expostos ao HIV-1 não eram infectados, além disso suas células T CD4+ eram altamente resistentes a entrada do vírus in vitro. Estudos subsequentes demonstraram que esta resistência poderia ser causada por uma mutação no gene que codifica o CCR5. Uma deleção de 32 pares de bases, conhecida como mutação CCR5 delta 32, ou CCR5Δ32. A deleção causa um frameshift, ou seja, uma mudança na fase de leitura durante a tradução, afetando as últimas três regiões transmembranares do CCR5, mais especificamente no segundo loop extracelular onde ocorre o sítio de ligação da proteína G responsável pela transdução de sinal celular. O alelo mutante contém 215 aminoácidos, enquanto o alelo selvagem possui 352 aminoácidos, o que gera então uma proteína truncada que não pode ser detectada na superfície celular. (DEAN et al., 1996; SAMSON et al., 1996; LIU et al., 1996). Estudos demonstram que o alelo delta 32 tenha surgido de uma mutação simples e que este evento tenha uma origem recente no nordeste da Europa (LIBERT et al., 1998), portanto a frequência na população caucasiana encontra-se mais elevada do que em outras etnias, girando em torno de 10%. Esta mutação tem característica autossômica recessiva, portanto os indivíduos heterozigotos para a CCR5 delta 32 ainda conseguem expressar, de maneira diminuída, os receptores, já indivíduos em homozigose para a mutação, apresentam ausência do receptor CCR5 (SAMSON et al., 1996). Estes fatos constituem uma evidência da capacidade duradoura do controle do vírus. Uma das hipóteses para que um indivíduo tenha o perfil de progressor lento ou controlador de elite é a mutação CCR5 delta 32, pois, é essencial no momento da interação vírus-célula hospedeira que haja ligação com este co-receptor, portanto, em sua ausência ou baixa expressão, a entrada do vírus para o meio intracelular fica prejudicada (CARRINGTON et al., 1999). No Brasil a frequência da heterozigose varia de 6.8% a 14.2% na população caucasiana; de 1% a 6.4% na população descendente de africanos e de 0.4% a 2.2% na população indígena (BOLDT et al., 2009; VARGAS et al., 2006; CARVALHO et al., 2004; CARVALHARES et al., 2005).

Primariamente, o objetivo do presente estudo foi caracterizar através da técnica da Reação em Cadeia de Polimerase (PCR) a homozigose ou heterozigose do gene CCR5 em paciente HIV positivos recém-diagnosticados. Como objetivos secundários, foi realizada a análise da relação entre a presença da mutação CCR5 delta 32 e as origens étnicas, bem como a análise dos dados laboratoriais (contagem de CD4, CD8 e carga viral). A amostragem consistiu em 16 pacientes atendidos na Unidade Complexa Hospital Dia – Willian Rocha, Guarujá. O DNA foi extraído a partir das células mononucleares de sangue periférico. Após a extração, realizou-se a PCR e o produto da reação foi analisado a partir de eletroforese em gel de agarose (3%) (MUNERATO et al., 2003). Complementarmente, foram coletados os prontuários dos pacientes contendo os dados laboratoriais e epidemiológicos. Desta forma, observou-se a presença da deleção CCR5 delta 32 em uma frequência de 25% do total da nossa amostragem, sendo caracterizados como heterozigotos, entretanto nenhum homozigoto para a deleção foi detectado. Não houve correlação entre as origens étnicas e a presença da mutação. Foi realizado o teste estatístico T de student comparando as médias de CD4, CD8 e carga viral dos pacientes heterozigotos para a mutação CCR5 delta 32 em relação aos homozigotos para o alelo selvagem. Não foi observada diferença significativa. Podemos concluir que a técnica de PCR utilizada obteve resultados satisfatórios para a detecção da mutação CCR5 delta 32. A frequência observada nesta amostragem foi maior do que a encontrada em outros trabalhos com amostras brasileiras; o que pode estar relacionado com a miscigenação da população estudada.

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Referências


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